25/12/2015

lugar-vazio

deste lado do mundo
tudo é silêncio

algures entre o reino
dos vivos    e
dos mortos

existe um lugar-vazio    onde
tudo é silêncio

entre o hoje e    o
amanhã
entre o que esteve
para ser    e
o que nunca foi

entre todos os dias     que
não contei do teu lado
e que não contarei     mais
porque

não existem terceiros dias
suficientes     para
que ressuscites antes
que o mundo     silenciosamente
se quebre

que ressuscites...
que ressuscitasses!,
neste lugar-vazio     tão
cheio de nada
tão cheio     de

ti

26/03/2015

há tantas mãos vazias

há tantas mãos vazias no mundo
tantas portas fechadas
há medos que sufocam
há incontáveis noites cerradas

há um relógio que não pára
que não perdoa    que não chora
há um curso que continua
e habitua a vida a esquecer
as vozes que ignora

há esta vastidão de mundo
que nos absorve
por inteiro    nos engole

há este silêncio mudo
que corta que suprime que mata
e pela letargia    nos demove

mas há também um pensamento
que não cala:

por quantas mãos vazias
se fizessem cheias de outras mãos
nos livraríamos do que nos oprime
e nos chamaríamos     então
irmãos?

18/03/2015

o malmequer

já não sei se sou
aquilo que em reflexão
escolho ser    ou
o que o coração
(esse ser ingovernado) quer

assim que há rumor
de que a ponderação voou
sou poeta bem amado    ou
quem por costume
(quiçá por amor)
arranca pétalas de malmequer

chamaram-me equilibrado
não sabem que estou
em tremor de terra
sou zona de guerra

salve-se quem puder

12/03/2015

mar calmo mar bravo

mar calmo    mar bravo
inconstante ir e vir de marés
quem o vê brando e delicado
julga saber quem ele é

e eu que nasci a seu lado
não confio
não me fio em ter pé

basta o sopro do vento
uma perda de alento
e somos poema
rebentação serena que ruge
em busca de fé

descubro-me então sal-gema:
trago em mim todos os sóis e luas
que sobre si amanheceram,
adormeceram e acordaram

trago em mim todas as ruas
que os seus braços impetuosos
furiosamente inundaram

trago em mim todas as tempestades
de fogo-mar extravasado

trago em mim todas as calmarias
noites, sonhos e dias,
um quadro idílico de praia
vagarosamente pincelado

Retirado de: https://quadroseretratos.files.wordpress.com/2012/03/a-praia-raquel-taraborelli.jpg

20/02/2015

indigo

everything goes from raspberry red
to deep down under
indigo blue

this immense roller coaster continuously
straining my breath     and simultaneously
forcing the air out of my lungs in shouts
into the void

(is this void devoid of your voice
or can I listen to you in my dreams?)

I hadn't felt so safe for so long
I’d forgotten how it felt
to believe in the arms put around me

I forget how we fell into place
and I wonder if we could ever fall out
once more    strangers

(is there somewhere outside
of this world where we can stop
on our journey to nowhere    anywhere?)

I feel scared
and this is what I was afraid of
how can I love without fear?

14/02/2015

apaixonaste-me, e agora?

o teu cheiro regressa-me e assombra-me
e então pergunto-me se
todas as paixões são habitadas pelo cheiro
de quem as domou

o teu toque deixa saudades
mas por costume volta    e revolta
tudo em mim
como bem-vinda tempestade
como maldita poesia

o teu olhar encosta suavemente    por momentos
e depois eletrifica-me
e então há luzes a explodir
e então há sóis que reacendem
e então há só este espaço-nós entre tu e eu

damos as mãos
encontramo-nos em lábios que se provam
e mal acredito na sorte grande de te ter aqui
de ter em mim
de te saber meu por enquanto

por quanto tempo ficas?
e torço os dedos para que digas
que hoje ficas de vez