22/12/2011

Fado


Tenho dias assim.
Em que a saudade aperta
E o concreto escorre
Por entre rios de ternura,
Amor,
Melancolia,
E um toque de jasmim.

Tenho dias assim.
Em que a vida nada mais é
Do que o doce vagar das ondas.
Assim calma,
Assim gentil,
Assim vazia.

Tenho dias assim.
Em que o tempo nada mais parece
Do que a areia que,
Numa paciência virgem,
Obedece à atracção da gravidade.

E o presente entristece.
Por isso se traçam planos absurdos,
“Do futuro virão mundos e fundos!”
E a esperança parece que renasce.

Tenho dias assim.
E não me resta
Mais que a poesia,
O vagar do tempo,
Olhos postos no outro dia
E, até lá,
Coração congelado.

Em cima do estrado,
Fica pois a fadista,
Com seu gemido medonho.
E no dia seguinte,
Paira ainda a melodia da guitarra,
Triste,
Frágil,
Longínqua,
Ou o que em costume
Resta das memórias
De um sonho.

Ser e Errar


Às vezes preciso de ser apenas eu,
sozinho no canto dos meus pensamentos;
ou apenas eu,
aí do teu lado,
procurando alentos no silêncio;
ou apenas eu,
no centro da praça
- onde a vida passa a correr -,
só para ver
se consigo ser eu,
apenas eu,
no maior dos perigos,
no mais seguro dos caminhos,
enquanto o rouxinol ainda procura
as notas certas para cantar.

Porque eu sou jovem,
cheio de jovial aventura,
procura,
indecisão,
perdido nas entrelinhas da vida,
onde sempre faltam didascálicas.
Mas tudo o que eu quero para mim,
um dia,
é ter amor e ser feliz.

Entretanto,
sou apenas mais um
que percorre os trilhos das montanhas,
à procura do seu lugar bruxo.

Sonhos


Rio manso a correr
quero ser
estrela a voar
ou fixa no lugar.
O que importa?

Eu, cá, vou é no meu navio,
onde sou capitã
e alumio
as brandas vagas
que embalam o amanhã…

19/05/2011

Adormecer sobre uma cama d'água

Adormecer,
Como quem
Caminha em pés de lã
Sobre sonhos de
Algodão puro.

Adormecer,
Como quem
Saboreia o doce embalo
Da voz daquela
A quem mais amamos.

Adormecer,
Como quem
Voa em raios de prata,
Penetrando na
Escuridão cerrada.

Adormecer,
Como quem
Se deita sobre
Uma cama d'água,
Dando a tarde
Por acabada.

Inclusão Social

Inclusão social. Jovens. Assuntos relacionados?


Eu diria que sim, intimamente relacionados. Comecemos por lembrar que para se estar incluído e activo na sociedade contemporânea são necessárias uma cultura e formação sólidas. Trocando por miúdos, é preciso saber o que se passa, ponto final. E se, por um lado, há quem não o saiba porque está ocupado a tentar arranjar onde dormir e o que comer, também há quem se dê ao luxo de simplesmente não querer saber.

Geração “EU”, assim mesmo, com letras maiúsculas, a negrito e itálico, se for preciso. Mas, claro, os culpados, pobrezinhos, são sempre os pais. Já o eram quando censuravam, quando batiam de cinto, quando mandavam os filhos trabalhar sem nunca lhes dar um tostão. Mas, agora, uiiii, agora é que são elas! Culpadinhos, os pais; não há júri que não os mande para a forca. Bem, o que eu tenho a dizer é que ainda penso que cada um é – ou é suposto ser – pessoa por seu próprio mérito e honra. E talvez não seja tanto o colo dos pais o grande criminoso, como o é a inconsciência desta realidade. Ou seja, temos uma geração “EU” que, simultaneamente, não sabe ser ninguém sem ter alguém que o afirme. Ou alguém sobre quem se afirmar. Pouco complexo, não?

Pois é, a vida podia ser mais simples. Mas há muita preguiça. E acima de qualquer outra coisa, muito egocentrismo. Diga-se de passagem que o antropocentrismo também não tem resolvido grande coisa. Apesar de ter sido criado, segundo o meu ver, como uma forma de exortar o ser humano enquanto criatura boa, responsável e RACIONAL – assim mesmo, com letras maiúsculas, a negrito e itálico, se for preciso –, esta visão foi destorcida até se gerar e, pior, instalar (!) um antropocentrismo relativo, que deixa o destino do mundo à vontade de cada freguês, e salve-se quem puder, que eu já me safei. Há um desinteresse completo no outro, no que ele tem para dizer, na sua dignidade enquanto ser igual a nós. Repito, IGUAL a nós – a mim, a ti e a todos os outros. E deixemos de lado se é pobre, se é rico, ou qualquer um dos dois a fingir que é o outro. Se todos fôssemos verdadeiramente ouvidos – aliás, como a isso temos direito, enquanto irmãos (mas deixemos este assunto para outra altura, que ainda me processam por ser anti-laicista) –, e não imediatamente julgados, apreciados e rejeitados, talvez – apenas talvez – existissem menos famílias a viver acima das suas possibilidades; mais profissionais com gosto pelo seu emprego e sem medo de seguirem a sua verdadeira vocação; menos objectos, coisas e coisinhas; menos clausura; menos exclusão social! Menos crise! Acima de tudo, de valores – os quais, no fim de tudo, são a base mais sólida sobre a qual se pode construir uma sociedade.

Por isso, perdoem-me por não chamar “pobrezinho” a um jovem que se queixe do nosso país, e cuja única acção para construir o seu lugar neste mundo é ir a uma manifestação de mês a mês. Porque é disso que se trata: não de um emprego, mas de uma vida – algo que as pessoas parecem ter medo de assumir. Isto, porque uma vida não se resume a um salário no fim do mês. É preciso mais. É preciso criatividade e pro-actividade. É preciso vida!

E é preciso, acima de qualquer outra coisa, a instituição e verdadeira percepção do valor da dignidade humana. Seja aqui, seja na América, na Austrália ou na Líbia. Perceber que, talvez, a crise de Portugal não é a pior injustiça dos nossos dias. Perceber que há um mundo fora das nossas portas, dos nossos empregos, escolas e mentes. Perceber que há mais gente, mais pessoas iguais a nós mesmos, dentro e fora do país. É preciso que nos incluamos a nós próprios na sociedade, de forma activa e sempre disponível. E esta revolução deve começar nos jovens, nos que têm – ou deveriam ter – mais energia, novidade e vida. Nos que são o futuro.

Sem queixas ou culpas, porque, afinal, o barco é de nós todos.

01/04/2011

Começar de novo, com mel nos olhos

  Hoje deparei-me com uma tarefa algo difícil: tive de revistar uma capa antiga, repleta de todo o tipo de provas de que eu – sim, EU – também fui pequenina e ingénua e inocente… E criança.


  Na verdade, seleccionar documentos antigos – neste caso, datados do meu quarto ano – não é necessariamente um objectivo custoso. Pelo menos, para mim não foi… Durante os primeiros dois minutos. Depois disso, a objectividade começou a ficar toldada: a necessidade de me livrar da tralha perdia terreno face à imersão nas memórias. Demorei duas vezes mais do que esperava, porque, de súbito, todos os pequeninos escritos e sarrabiscos se tornaram curiosos e dignos de contemplação.

  Queria lembrar-me de tudo: de como era acordar de manhã e partir para a escola, pela mão da minha mãe; do cheiro do seu único “vício”, o café; de como sabiam os pães com manteiga nos intervalos, por vezes trocados por outros petiscos mais apetecíveis; do leite com chocolate, cujos pacotes eram das leituras mais fascinantes na altura… E de como era ser criança. E de como foi deixar de o ser.

  Toda a vivência dos momentos – e não são tantos assim – que hoje consigo recordar, desde que a memória se tornou possível em mim até ao agora mesmo, em que escrevo estas palavras; toda a magia e todo o misticismo a que sabe o passado… Tudo isto me torna em quem sou. E sei, porém, que não estou sozinha na minha nostalgia esporádica. Todos nós pensamos no que fomos, no que sentimos, no caminho que calcorreamos até ao ponto em que, actualmente, nos assumimos – vitoriosos ou nem tanto assim. Mas, claro, uns rememoram mais e outros menos. E pouco têm os jovens contemporâneos de nostálgico. Ou não o querem mostrar, nem a eles mesmos.

  Talvez pudesse ser, de facto, da juventude, e então, eu seria apenas a excepção que confirma a regra, já envelhecida no que toca a certos recantos; contudo, sinto que falta algo da poesia do passado nos nossos caminhos presentes. Porque o passado nos traz experiência, sabedoria e muito amor – amor ao que fomos, ao que vivemos e aos que o viveram connosco – e, sobretudo, porque nos deparamos com ele todas as manhãs.

  Sempre que nasce outro dia, nós erguemo-nos novamente, mas não do nada. Não renascemos – antes ressuscitamo-nos, (quase) sabendo que enfrentamos um novo começo, sem, porém, partir do quilómetro zero. Isto, porque todo o santo nascer do sol – de todas e cada uma das vezes – colocam-se diante de nós todas as barreiras que já encarámos. E é nosso dever vital encontrar-lhes os pontos fracos e apercebermo-nos, mais uma vez, de que, no fim de contas, não são mais do que o pó da estrada acumulado sobre os nossos pés. Não passam de calos de viajantes mais ou menos penados.

  Mas também revivemos o que foi bom: em dias de sol e tempo ameno – curiosamente, como o de hoje – ainda sinto o sabor ao pão rústico molhado em azeite, que sabe a passeios de carro, num domingo à tarde, pelos montes verdes, dourados sob a luz e o vento calmos, que embala a consciência do momento, até não eu não ser mais do que quem sou e não ter que fazer mais do que sê-lo. E sinto mel na expressão dos meus olhos e do meu sorriso; e estou certa de que a calma e o amor da memória estarão sempre ao alcance de um suspiro. E já sei como é voltar a ser criança de novo.

Sou o futuro (Estudante)

Toca o despertador.
Nunca há tempo.
Quero tudo,
tudo menos trabalho.

Corro pela rua fora,
já chega de atrasos.
Chega! Mas só
mais hoje…

Quero tudo.
Não me importo
com nada.
Procuro sempre
alguma coisa.
Finjo que não sei,
ser estudante
é o melhor trabalho:
quando se trabalha,
recebe-se.
Falta-me alguma coisa.
Tenho tudo.
Falta-me tempo.
O que é tempo?
Já não sei…

Estou em todo o lado.
Vou sempre a correr,
Já não estou aqui.
Já não estou ali.
Já não estou.
Sou o futuro.
O futuro de quem?
O meu está cheio de erros.

Não se erra quando
não se sabe?
E eu não sei.
Não sei, nem tenho tempo
para descobrir.

Será sempre assim?
Quando vai haver tempo?
Quando vai haver paz?
Quando vou poder parar?

Mas parar é morrer.
E eu gosto da vida.
Essa corrida desenfreada
por entre o saber,
o conhecer,
o descobrir.

É uma escola.
E todos somos alunos.
E todos erramos.
Mas quem corre,
sempre alcança.

16/02/2011

A vida são marés

A vida são marés,
Correntes a chocar.
Águas frias, águas quentes,
O vento a empurrar.

A vida são marés,
Todas as ondas do mar.
A vida são divagações
Numa noite ao luar.

A vida são marés,
Sonhos a naufragar.
Destroços abandonados
Que ninguém vai reclamar.

A vida são marés,
Barcos a derivar.
Lá piscam os faróis,
Tentando nos guiar.

A vida são marés,
Mastros postos ao ar.
Portugueses em terra,
Portugueses no mar.

A vida são marés,
Estrelas a sonhar
Com o dia em que nunca
Vão poder mergulhar.

A vida são marés,
Vagas a mudar.
Até as tempestades
Acabam por passar.

A vida são marés,
E nós sempre a nadar.
Talvez seja hoje
Que o vento

Nos vai levar.

Foi um fogo-de-artifício

Foi um fogo-de-artifício
que chegou,
estourou
e passou.

Agora é ouvir
o sábio:
"Foi bom
enquanto durou".

O passado não se recupera,
e lá atrás ele ficou
escrito em todas as memórias
que a tua ilusão deixou.

Agora é aproveitar o presente,
amá-lo plenamente;
Correr na direcção da vida;
Arranjar outra saída;

Viver com esperança;
Deixar sarar a ferida;
Amar com temperança;
Ver com novos olhos a vida;

Reclamar os bons momentos
à tua difícil lembrança;
Libertar todos os pensamentos
Desta descompassada dança;

Abandonar toda a ignorância.

03/01/2011

O teu nome

O teu nome.
Soa tão bem:
o teu nome.

Esta expressão,
que soa a promessa
de sorriso,
e sol,
e calor,
e música,
e mel.
E poesia.

E, por acaso ou magia,
talvez o teu nome
apenas soe bem
porque é teu.

Luz de Esperança

E se a Luz brilhar nas Trevas
E ninguém a receber?

Mesmo que me doa,
Mesmo que me custe,
Não posso deixar-me ficar.

Se o mundo gira,
É porque também tenho
De andar.
Mesmo que fosse mais fácil
Parar,
Deitar,
Adormecer e
Acabar.
Se a Luz brilha nas Trevas,
Eu vou recebê-la.
Essa Luz de pura esperança,
Fá-la-ei parte desta
Mortal e eterna dança.

Tempo

Tempo, que és eterno e volátil.
Que me roubas o doce momento,
Que alongas a minha ânsia frágil.

Tempo, que és como o mar,
Num perpétuo vaivém de ondas.
Vem, e vai, vem, e vai, vem…

Tempo, que não te deixas ficar!
Que me obrigas a andar,
Andar, andar, andar, andar!
E não me deixas nunca parar…

E quando preciso que te sumas,
Quando quero que te vás,
Paras, alongas-te, ficas,
Estendes-te pela areia fora.

Ó Tempo, que és condição de tudo!
Que trazes movimento ao mundo!
Que trazes amargura ao poeta!
Que trespassas o momento como uma seta!
Que me tiras a liberdade,
E ofereces somente ansiedade…

Tempo, que vens e vais.
Que sempre corres e nunca mudas.
Sempre dinâmico, sempre estático,
Sempre volátil, sempre eterno.

Tempo, que me roubas este doce momento,
Que me deixas no desalento
De hoje não ser ainda
Amanhã.